segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Debaixo D'água.

Entre as funções vitais do ser máquina humano, acho o ouvir a chave primordial de tudo.
Ouve-se. Pensa-se. Fala-se. Confabula-se. Escreve-se.
Desenha com novo prisma tudo aquilo que move e é sagrado. E remove as concepções pré-estabelecidas pela cultura arcaica que nos molda desde a tenra infância.
Então, ouvindo, voltamos a concerber-se, ou até, compreender de forma mais ampla aquilo que nos cerca. Por isso ouço. E escrevo partindo da audição, até por que a minha moenda de texto, usina-se daquilo que vem como música - por muitas vezes - ao meu cotidiano.
Indico: Bethânia e Arnaldo Antunes (Debaixo D'agua - Maria Bethânia - Composição: Arnaldo Antunes) como texto necessário pra começar a semana.
Debaixo d'água tudo era mais bonito, mais azul, mais colorido, só faltava respirar

Mas tinha que respirar...

Debaixo d'água se formando como um feto, sereno, confortável, amado, completo, sem chão, sem teto, sem contato com o ar.

Mas tinha que respirar. Todo dia. Todo dia, todo dia, todo dia. Todo dia, todo dia...

Debaixo d'água por encanto sem sorriso e sem pranto, sem lamento e sem saber o quanto esse momento poderia durar, mas tinha que respirar...

Debaixo d'água ficaria para sempre, ficaria contente, longe de toda gente, para sempre no fundo do mar. Mas tinha que respirar, todo dia. Todo dia, todo dia, todo dia, todo dia, todo dia...

Debaixo d'água, protegido, salvo, fora de perigo, aliviado, sem perdão e sem pecado, sem fome, sem frio, sem medo, sem vontade de voltar...Mas tinha que respirar.

Debaixo d'água tudo era mais bonito, mais azul, mais colorido, só faltava respirar, mas tinha que respirar... Todo dia.


Agora que agora é nunca. Agora posso recuar. Agora sinto minha tumba, agora o peito a retumbar - Última resposta - agora quartos de hospitais.

Agora abrem uma porta, agora não se chora mais, agora a chuva evapora, agora ainda não choveu, agora tenho mais memória, agora tenho o que foi meu.

Agora passa a paisagem, agora não me despedi, agora compro uma passagem, agora ainda estou aqui, agora sinto muita sede, agora já é madrugada, agora diante da parede, agora falta uma palavra, agora o vento no cabelo... Agora toda minha roupa, agora volta pro novelo.

Agora a língua em minha boca, agora meu avô já vive, agora meu filho nasceu - filho que não tive - agora a criança sou eu, agora sinto um gosto doce, agora vejo a cor azul, agora a mão de quem me trouxe, agora é só meu corpo nu...

Agora eu nasço lá de fora, agora minha mãe é o ar, agora eu vivo na barriga, agora eu brigo pra voltar...Agora.

Agora.

Agora.

Um comentário:

Alexandre Alencar disse...

É muita coisa pra pensar prum começo de semana...rs. Acordei com tanta pensamento nessa cabeça de azeitona. Acordei sem um acordo comigo mesmo.
Mas, tem-se que ter sempre um começo. Agora que o agora é nunca.
Abraço enorme.

Sou o que me convém ser...

Sou o que me convém ser...